" A transformação de vidas através da Gestão de Pessoas e Desenvolvimento Humano."

3 de fevereiro de 2015

Felizes daqueles que se alienam?


Nos primeiros meses de todos os anos, vem aquela espera ansiosa pelo carnaval. Chega então a hora de brincar, dançar, namorar e esquecer os problemas. Seria tudo muito bom se, nesta última "função", as pessoas não esquecessem, além dos problemas pessoais, o fato de que vivem numa realidade social e política bastante hostil. É esse ponto que dá à folia um ponto negativo, em contraposição ao seu brilhante aspecto de manifestação cultural.
O carnaval é muito positivo enquanto visto como parte da cultura brasileira, mas passa a ser algo prejudicial a todos e à própria pessoa quando é usufruído como uma ilusão onde a realidade pode ser ignorada e a alienação, tratada como se fosse uma liberdade válida. Aliás, tem sido essa uma das grandes "utilidades" do feriadão festivo. Os limites morais entre a descontração e a alheação das problemáticas global, nacional, estadual, municipal e local não são respeitados.
É o que se percebe pela mídia, que encoraja essa alienação, e pela sociedade em si, que não aproveita o momento alegre para expor nem ao menos seus desejos mais vagos por uma nação melhor. A primeira também quase esquece que o Brasil ainda não terminou sua evolução e exalta as diversas futilidades que marcam tal manifestação cultural: enquanto "gostosas" famosas desfilando nas escolas de samba, celebridades nos camarotes e a cobertura quase constante das festas são de praxe na TV, tantos outros assuntos têm sua importância muito reduzida perante os telejornais. Implicitamente a própria televisão ordena que a pessoa esqueça tudo ao seu redor, entre na “onda” e seja "feliz" na folia.
O povo obedece e realmente desliga-se de tudo, desde da crise hídrica, da “operação lava jato”, do alto índice de desemprego até da alta da violência. Dois detalhes ilustram a alienação carnavalesca: primeiro, quando perguntamos algo do tipo "você sabe qual foi a última da Presidente?", somos respondidos com uma frequência notável com, por exemplo "Ah, deixa pra contar depois do carnaval que agora só quero pular"; segundo, a ausência quase total de pessoas que, em grupo, aproveitam o momento para fazer algum protesto irreverente uma lamentável falha quando lembramos que nosso povo é tão criativo mas não se dispõe em canalizar seus desejos e indignações na festança.
Eventos de lazer que assegurem à pessoa o direito à diversão e ao desligamento temporário de fardos pessoais devem ser encorajados, mais ainda quando se tratam de manifestações culturais apoteóticas que fazem brilhar a identidade cultural do povo. Esse incentivo, contudo, não deveria ser aplicado para transformá-los em "mundos de ilusão" onde as pessoas fingem estar livres de uma realidade carregada de complexos problemas. Quem gosta de carnaval tem todo o direito de brincar, desde que não se esbalde em vícios e não exacerbe violência, mas precisa entender que não é ético utilizar a folia como pretexto para apagar de sua "agenda mental" a obrigação de lutar por uma sociedade mais justa.
Porém, termino este artigo com uma frase que me foi dita por uma amiga durante este semana: “Felizes daqueles que se alienam”.

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